Você talvez vai começar a ler o novo romance de Flávio Komatsu. Romance hipertextual, e talvez já esteja o lendo. Talvez até acredite que já tenha chegado a um fim. Hipertextualidade é assim mesmo: mais de um ponto de entrada, muitas ramificações internas e nenhum final bem definidoQuem garante que este é o início? Não há garantias. Não há paradigmas. O hipertexto ainda é terra de ninguém: ninguém escreve, ninguém lê. Publica só aquele que não tem nada a perder... 

Minto? 


Claro, e aqui também. Estou arriscando tudo, a perder meu leitor de vista, esse tão ninguém quanto eu que se bifurca pelos meus jardins... Eis minha autoria. Minha? Pois minha. O autor não está morto, só te perdeu em meio aos escombros. E, mesmo nessa perdição, tem meu cálculo de poesia. Esses caminhos narrativos, esses encontros dramáticos, quem mais senão eu que vem a te oferecer? Tuas escolhas, sim, mas do mundo que me fiz deus. O cargo estava vago. O mundo, fragmentado. Com um ou outro hiperlink, dei-lhe alguma coerência: essa, essa aí, estava aqui agora mesmo. Logo você encontra. É possível dar sentido a tudo... 

(porque assim quis deus)

E por que chamo de romance? Porque sou só um Flávio Komatsu: quem sou eu pra ir chegando com um novo gênero debaixo do braço... É preciso se filiar à tradição, nem que seja como filho bastardo. Esse tal de anti-gênero se fez colo aconchegante: tomo seu nome, reivindico o status e não hesito em jogar na lama. Sou romance não impresso. Sem registro em cartório. Atirado rio abaixo, volto agora pra matar meu pai. Foder minha mãe. Furar os olhos da ficção contemporânea...

(chega de metáforas)

Eu lhe diria pra escolher a posição mais cômoda, mas você pode estar no celular. Indiferente à postura mais esdrúxula, vai interrompendo, me adiando, outra janelinha já piscando... Sem ressentimentos. Hipertextualidade é assim mesmo: tudo ao mesmo tempo e inusitadamente conectado. Às vezes fui eu mesmo quem te levou a outro lugar. E se é de fato outro, difícil saber: as fronteiras estão se diluindo, por mais que o neoliberalismo erga seus muros de liberdade... Quando tudo parecer definido, cabe a mim lhe oferecer o descaminho. A desordem do vivido. A angústia do livre-arbítrio. 

Se acredito mesmo no que digo?


Si, si, mas não me leve tão a termo. Não me conformo com grandes verdades e sou mais humilde do que pareço. Por hora, vai me servindo. Se deus não existe, tudo é permitido? Nem tão dogmático, nem tão permissivo. Assim como a vida, como a literatura... Literatura, sim senhor. Ou tem outro nome pra isto?