Nos cabelos, ainda resta o caos da noite: mil corais de uma medusa se espalham e invadem o rosto. Os olhos, no entanto, estão rendidos, e borrados no entorno, têm uma paz inusitada. Respira um sono leve, imaculado, e a boca, entreaberta, assovia um aroma etílico. O suor lhe impregna toda a pele, no pescoço, no decote, no mergulho pelo vale – um botão sustenta o elo da camisa na tensão, sob a flanela, de dois seios libertários. Abotoo os botões que seguem abaixo, e tomo os braços, então abertos, e os acomodo junto ao tronco. As longas pernas se estendem pela cama, pela calça jeans rasgadas, e vão à borda do colchão; teus pés descalços, pendendo sujos e sagrados: eis você, meu bem, de novo sã e salva no meu quarto. E eu poderia te velar a vida toda, ser feliz assim à toa, até hoje eu não entendi: o que foi dito, o que foi feito, o estopim, da grande merda que nos houve e, de repente, fez o fim.